quarta-feira, 15 de junho de 2016

O Mistério de Órion

Henrique Di Lorenzo Pires (Monitor UFMG/Frei Rosário)

Introdução

            Nesses últimos tempos estivemos observando muitas coisas interessantes pelo céu afora. Mas parece que o catálogo de atrações celestes é infinito. Pudera! Quantos astrônomos na antiguidade dedicaram uma vida inteira vasculhando os céus e mesmo assim perderam muitos dos grandes espetáculos protagonizados pelos astros. Hoje estamos munidos de instrumentos poderosos, que nos permite ir mais longe, dissecar minuciosamente cada detalhe do imenso palco estelar! Não somente eles, mas qualquer astrônomo está destinado à mesma sorte: a astronomia é um dos poucos ramos da ciência em que descobertas surpreendentes, fotos admiráveis ou dados curiosos são divulgados a todo o momento.
            Nesses meses que seguirão teremos a oportunidade de observar outra das mais belas constelações: a constelação de Órion.
            Órion, o caçador, de acordo com a mitologia grega, desempenhou um papel importante para as civilizações antigas. Sua posição no céu ao longo do ano era um prenúncio das mudanças climáticas que estavam por vir.  Quando se observava Órion nascer durante o amanhecer, era um sinal que o verão houvera chegado. Seu nascimento no início da noite anunciava o inverno, e à meia-noite indicava época da colheita de uvas. Essas observações foram feitas por civilizações do hemisfério norte. Para o hemisfério sul vale o contrário. No meio de dezembro Órion estará nascendo para nós (no leste) após o crepúsculo. O que isso pode nos indicar? Isso mesmo! Preparem-se para o verão!

O caçador Órion

            Conta-nos a mitologia grega que Órion era um gigante caçador,filho de Netuno e favorito de Diana, com quem quase se casou. O irmãode Diana, Apolo, por sua vez, se aborrecia com tal aproximação entre osdois, chegando a censurar diversas vezes sem nunca obter resultado.  Certo dia Apolo teve a oportunidade de se ver livre de seusaborrecimentos: percebendo que Órion vadeava pelo mar apenas com acabeça fora d’água desafiou sua irmã, outra exímia caçadora, a acertar oalvo que distante se movia. Impecável em sua pontaria ela atingiu emcheio seu amadocujo corpo  moribundo foi conduzido à praia pelasondas do mar. Percebendo a fatalidade que havia cometido, Diana, emmeio às lágrimas, colocou Órion entre as estrelas: o gigante trajado comum cinto, uma pele de leão, armado de uma espada e de sua clava,acompanhado por Sírius, seu cão e com as Plêiades fugindo do caçador.
             As Plêiades eram ninfas do séqüito de Diana por quem Órion se apaixonou e perseguiu. Elas, desesperadas,  conseguiram escapargraças a Júpiterque as transformou em pombas e então numaconstelação do céuEmbora as Plêiades fossem setesomente seisestrelas são visíveis no céu – nos conta a lenda que Electra não conseguiusuportar a dor de ver a cidade de Tróia, que fora fundado por seu filho,cair em ruínas e abandonou seu lugarSuas irmãs se empalideceramdiante de tal visão.
            Abaixo se segue um trecho do poema de Henry Wadsworth Longfellow sobre a “Ocultação de Órion”, cujos versos expressam omomento em que suas estrelas são ocultas, aos poucospela Lua:


rubra pele de leão caiu-lhe

Aos pés, dentro do rio. E a bruta clava

cabeça do touro  não fere

Voltado, como outrora,quandojunto

Ao mar, cegou-o Eunápio e emsua forja,

Procurou o ferreiro, e a rudeencosta

Galgou penosamente, a passoslentos,

Fixando no sol o olhar vazio.






constelação

            Você possivelmente  conhece a constelação de Órion, ou pelomenos parte dela. Aquele conjunto de três estrelas popularmentechamadas pelos brasileiros de “Três Marias” nada mais é que o centro daconstelação – representa o cinturão do gigante (vide figura acima). Sabendo encontrá-las, encontra-se a constelação completa facilmente. Nesse mês de dezembro procure por Órion após o anoitecer no Leste. Osol estará se pondo e do outro lado veremos Órion nascer.
            Veja o mapa a seguirEle representa a porção leste do céu logoapós o crepúsculo. A constelação de Órion está destacada na figura – perceba como é fácil identificar o padrão após encontrarmos as TrêsMarias. Elas estão envolvidas por um trapézio formado por quatro estrelasde primeira magnitudeAlfa de Órion (Betelgeuse), de coloração maisavermelhada, representa o ombro direito de Órion, temos em seguidaGama de Órion (Bellatrix) como o ombro esquerdo, Kapa de Órion (Saiph) é o joelho. A última estrela do trapézio é justamente a que está oposta a Betelgeuse – Beta de Órion (Rigel), uma estrela que também se destaca, representando o  direito de Órion.

  
          Betelgeuse é uma das estrelas mais brilhantescujo diâmetrochega a ser 250 vezes maior que o do SolComo toda gigante suaatmosfera é bastante difusacom densidade muito menor que a de nossaatmosferaSua distância até nós é de aproximadamente 200 anos-luz. Observe a figura abaixo da constelação de Órion, com destaque paraBetelgeuse, prestando atenção especial nas escalas. Perceba a difusividade de sua atmosfera.
 
Nebulosa de Órion

            A nebulosa de Órion é um dos objetos presentes no céu maisinteressantes à observaçãoConhecida também como M42 ou NGC 1976, essa nebulosa difusa é uma das mais brilhantestanto que numa noite decéu limpo e num local longe de poluição e luz ela chega a ser visível aolho nu. Localizá-la não é difícil – ela se encontra na espada do giganteÓrion. Partindo das Três Marias, que é seu cinto, encontra-se a espadalogo abaixo. Compare o desenho de Órion (primeira figura no textocomfoto acima.
            M42 está a mais de mil anos luz de distância da Terra e écomposta principalmente por estrelas jovens e bastante quentes do tipo O (veja a dica “Observando as cores das estrelas”) num agrupamentoconhecido como o Trapézio. A radiação emitida por essas estrelas excita uma nuvem de gás e poeira que passa a emitir o brilho característico danebulosa.
            Documentos de observação dessa nebulosa datam desde 1610 (Nicholas-Claude Fabri de Peiresc). Em 1769 Messier a adicionou em seucatálogo, descrevendo como : “(...) uma linda nebulosa na espada de Órion, ao redor da estrela Theta, junto a outras três estrelas menores asquais não conseguimos ver senão com algum instrumento.”
            Observe as fotos seguintes. A primeira foto nos mostra anebulosa de Órion observada por um telescópio de médio porte. Asegunda é essa mesma nebulosa fotografada pelo telescópio espacialHubble!

  

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